O garrafão Português
Quem é que nunca se deslocou diligentemente para a praia popular mais próxima a fim de apanhar com um tremendo escaldão e encontrou uma alegre família a petiscar molemente à sombra de um ardente Garrafão a rebentar de uma mistura explosiva de branco-tinto absolutamente mortífera?
Ou quem é que nunca observou um grupo de simpáticos homens a mamarem copos atrás de copos, cujo recheio foi retirado de um modesto Garrafão de cinco litros enquanto batiam cartas batoteiras nas sebosas mesas das tascas?
Todos nós já presenciámos estas curiosas cenas, fantasticamente comoventes e regadas. Mas quem é que já pensou no verdadeiro significado nacional e internacional do Garrafão?
Ninguém!
Ele é um objecto esquecido pelos intelectuais portugueses, pela Comunicação Social e, o que é pior, pelo poder político, que se recusa determinantemente a estabelecer um estatuto condigno para este objecto tão apreciado pelos Portugueses.
É exactamente para promover este acto que eu me encontro estupidamente a escrever este texto. Deste modo, a minha argumentação baseia-se em três pontos incontestáveis e fulcrais, cujo conteúdo passo a explicar.
As três instâncias do ser
1) A estética platónica do corpo do objecto.
O Garrafão encontra uma das suas enormes qualidades no facto de ser um objecto encantadoramente estético. Ele fica bem em qualquer despensa, sala de jantar (com a Ceia de Cristo estrategicamente colocada na parede frontal à mesa), cozinha ou até quarto, caso as assoalhadas do apartamento assim o determinem.
E um objecto moderno, virado especialmente para a juventude, mas que visa atingir todos os escalões etários possíveis, aerodinâmico e prático, pois é facilmente transportável para qualquer lugar. É barato, com baixo custo de utilização e, o que está na moda, é recarregável.
2) 0 mundo supra-sensível como representação da coisa em si
O Garrafão tem um significado muito especial para o Português.
Ele representa uma cadeia de ligações de amizade e fraternidade entre os habituais possuidores deste celebérrimo objecto. Ele é um contributo inqualificável para a paz, harmonia e felicidade, que mais nenhuma outra realidade existente à face da Terra consegue dar. O Garrafão é um símbolo de unidade nacional e convivência democrática entre os habitantes da terra lusa, cuja força não pode deixar de ser reconhecida por parte dos máximos dignitários de Portugal.
O Garrafão é, resumindo este ponto com um vocábulo filosófico, o nómeno do povo português.
3) A racionalização das faculdades paradigmáticas do real.
O Garrafão obtém o máximo significado no seu aspecto cultural, tal como foi paternalmente reconhecido pelo Chefe de Estado do. O Garrafão é cultura!
Ele é utilizado pelos chamados filósofos do povo para adquirirem a inspiração necessária de modo a realizarem a sua acção humana. Teve um contributo considerável para a realização de máximas profanas, idealismos esquizofrénicos, filosofias morais e diários irreconhecíveis.
Os maiores representantes da cultura portuguesa facilmente se identificam com o Garrafão, e ele é catalisador de animadas discussões de ideias e serões diletantes; ou seja: ele produz uma dinâmica cultural ímpar a um nível cosmopolita.
A fundamentação lógico-formal do ser
Como todas as análises e discursos, esta teve um prelúdio, uma exposição e terá uma conclusão lógica proveniente do atrás discutido e, como falei do Garrafão, acabarei a falar dele.
E concluo com uma miscelânea de pensamentos humildes e sinceros, mas objectivos, de modo a lançar mais uma acha para a fogueira, tendo em vista a dignificação do Garrafão. (E por aqui me despeço, que já me está a dar o sono.)
A — O Garrafão è sinónimo de qualidade e quantidade, aliado a um preço imbatível.
B — É alegria, amizade. cores berrantes e vistosas.
C — Corresponde à nossa identidade, principalmente no que se refere aos de palha, e modernidade, Europa, civilização no tocante aos de plástico.
D — E, essencialmente, quando nós gostamos dele, escrevemos desta maneira...
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